Obra de arte popular e devoção
Dia 21 de novembro de 2019 Travancas ganhou um oratório de culto às almas do purgatório, embora sem o peto ou caixa de esmolas. Para quem vem de Arçádegos, povoação galega, o artístico monumento aos mortos fica à entrada da aldeia, na encruzilhada da Rua da Roçada com a estrada que vai para a fronteira.
Na Galiza os Petos de Ánimas anteriores a 1901 são considerados bem de interesse cultural. E na raia de cá, para quando uma lei protetora das alminhas?
O dogma do Purgatório, estado intermédio entre o Céu e o Inferno onde a alma do falecido com pecados leves fica de castigo até ser purificada, foi instituído no Concílio de Trento, no século XVI.
A concretização do dogma contribuiu para a expansão do culto às alminhas em Portugal e na Galiza no século XVII e seguintes. Marcas profundas da religiosidade popular, são
uma presença constante nas estradas rurais e encruzilhadas.
A crença de que bruxas e espíritos malignos se encontram nas encruzilhadas exprime o medo pelo desconhecido. Terá sido por isso que desde tempos remotos, para afastar tais temores, se ergueram monumentos e realizaram cultos a divindades protetoras dos caminhos, dos viajantes,
dos campos e das famílias.
Em sentido inverso, no século XXI, com o avanço da descristianização os petos, cruzeiros e capelas, estão a perder a função religiosa em detrimento da finalidade de preservação cultural associada à estética e ao belo.
No topo das Alminhas da Roçada figura uma cruz celta, símbolo identitário deste povo e anterior ao cristianismo, mas adoptado pela igreja irlandesa após São Patrício, padre irlandês, ter convertido os celtas à fé cristã.
A cruz céltica no oratório das Alminhas da Roçada também serve de pretexto para vincar a ideia de que Trás-os.Montes, pelas suas raízes, pertence à cultura celta, pujante na música tradiconal e nas festas solsticiais de Inverno.
O círculo da cruz, onde duas barras vertical e horizontal se encontram, simboliza o Sol, fonte da vida, a espiritualidade focada na Criação. Movimentos neo-pagãos, inspirados no culto solar, usam a cruz celta como amuleto que dá força e protege. Para os cristãos, porém, a cruz simboliza Cristo Redentor, o alfa e o omega, o principio e o fim do universo.
O beiral, de inspiração na arquitetura clássica do Renascimento, apresenta duas abas retilíneas que se tocam em esquadria para formar um ângulo reto. No seu interior está um delta com um ponto central. Na tradição cristã essa figura simboliza a Santíssima Trindade e o olho de Deus que tudo vê. Nas igrejas barrocas do século XVIII era costume representá-lo sobre o altar mor, irradiando raios de luz.
Pedra de apoio, para colocação de velas votivas e flores, mas onde ainda falta prender ao granito uma barra de ferro protetora para os objetos não cairem.
No nicho de azulejos das alminhas costuma estar representada a imagem de quem se recorre para interceder pelas almas dos falecidos. Os mais representados na iconografia são Nossa Senhora do Carmo, Cristo crucificado, arcanjo São Gabriel, Santo António, etc., e em alternativa , uma cruz.
"As crianças vão directas para o Céu, são
símbolos de pureza e por isso não têm nada para limpar no Purgatório".
Porque não recorrer diretamente ao Espírito Santo, terceira pessoa da Santíssima
Trindade, para interceder pela almas do Purgatório? A pomba branca, símbolo do Espirito Santo, irradiante de Luz, é mencionada na Bíblia, no livro do Génese, com uma folha de
oliveira no bico, a anunciar o fim do Dilúvio.
As almas, em agonia, suplicam orações e esmolas aos vivos para se purificarem e libertarem das chamas do Purgatório. A sigla P. N. A. M. em painéis de azulejos de Alminhas do século XVIII significa que se reze pelas almas do Purgatório Pai Nosso e Ave Maria.
A data em que a obra foi feita costuma aparecer nos azulejos.
A data em que a obra foi feita costuma aparecer nos azulejos.
"Irmãos, ajudade-nos a sair destas penas"
De todas as frases ligadas à necessidade de orar pelas almas, a que mais me agradou foi a das alminhas do antigo Albergue
de Peregrinos em Roriz, de que a empresa fez uma réplica bem feita,
com ligeiras modificações, para tornar a leitura mais fácil a qualquer
pessoa.
Frontaria do antigo Albergue de Peregrinos em Roriz, em abandono, antes das obras de reconstrução em 2017.
Alminhas da Roçada
Antes...
Depois
A edificação das Alminhas da Roçada só será dada por concluída quando o espaço envolvente, já expurgado de silvas, ficar ajardinado, rodeado de plantas de alfazema, alecrim e neriuns oleander.
2 comentários:
Benigne dicis gratias ago , Lorem Nativitatis
cordealement isaque
lol
Saudações natalinas Isaque
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