Espalhando as sementes do renascer
Argemil da Raia é um mundo de agradáveis surpresas onde, de quando em vez, encontro moradores, de mim desconhecidos, a trabalhar no campo e com quem não tem sido difícil estabelecer relações de empatia. Assim voltou a acontecer no início de outubro, quando numa saída, em tarde soalheira, que me levou à Fonte Fria e ao posto de vigia florestal, encontrei o semeador.
Soube mais tarde que se chama Urbino. Avistei-o ao longe, a ele e à esposa, em campo lavrado, num lugar ermo, a semear centeio à manta. O boculismo produziu em mim uma serena sensação de alegria e de bem-estar interior.
Fascinado pela beleza do cenário, parei a bicicleta e pus-me a olhar embevecido, enquanto um forte impulso, semelhante a um iman, me levou a aproximar do casal.
A parábola do semeador
«Ouvi. O semeador saiu a semear; quando semeava, uma parte da semente
caiu à beira do caminho, e vieram as aves e comeram-na.
...
...
Mas outras
caíram na boa terra e, brotando e crescendo, davam fruto; um grão
produzia trinta, outro sessenta e outro cem.
Disse: Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.»
Disse: Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.»
São Marcos, cap.4, vers. 3-9
A visão bíblica, do homem a deitar sementes à terra, também me trouxe à memória "O Semeador", famoso quadro de Vicent Van Gogh,
pintor holandês que retratou os trabalhadores do campo, que tanto admirava, em harmoniosa comunhão com a Natureza.
Canção do Semeador
"Na terra negra da vida,
Pousio do desespero,
É que o Poeta semeia
Poemas de confiança.
O Poeta é uma criança
Que devaneia.
Mas todo o semeador
Semeia contra o presente.
Semeia como vidente
A seara do futuro,
Sem saber se o chão é duro
E lhe recebe a semente."
Miguel Torga,
Sementeira de outono
Bairro das Poulinhas em Argemil.
... E a semente encontra-se a
germinar no imprevísivel.
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