quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

O último pôr do Sol

Por detrás dos castanheiros

Era uma vez dois anosos castanheiros bravos  através de cuja ramagem, nos ocasos de Inverno, via o pôr do Sol no  campanário.

 

Numa destas manhãs ensolaradas, mas de frio polar, munido  de moto-serra elétrica, deitei abaixo  os castanhos e dois carvalhos americanos. De  pé  ficou uma nogueira, que agora pode ramificar livremente.

 

 

 

Quando os conheci, há mais de quarenta anos, os castanheiros do Cabanco  já eram velhos. O tronco era tão grosso que não cabia no abraço de um homem só.

 
No tempo do avô Benedito as castanhas alimentavam recos para cevar. A carne, depois da matança, transformada  em  rojões, salpicões, chouriças, alheiras, sangueiras e presuntos, era o goBerno da casa  durante o ano inteiro. 

 
 
Mas o progresso tecnológico transformou o mundo rural na segunda metade do século XX. Mudou mais no espaço de uma geração do que em centenas de anos, antes.
 
 
As casas no bairro Além do Rigueiro deixam de ter cozinhas para o fumeiro e lojas para animais. Deixam de se criar recos para cevar  e as castanhas bravas do Cavanco ficam no chão a apodrecer. 

 

Sem função alimentar, os dois anosos castanheiros - e dois carvalhos que plantei mas não transplantei em devido tempo - convertem-se em  elementos  paisagísticos que humanizam o bairro.


 
Serrei-os, tenho lenha, mas não fiquei mais feliz.  Os castanheiros abatidos, pela ligação a várias gerações familiares  e pela memória que deles guardo, são parte de  mim que deixa de existir. 

 

 

 

 

Sem moto-serras continuariam em pé por mais tempo


E este  não teria sido  o último pôr do sol no campanário, por detrás dos velhos castanheiros!



 


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