Uma casa com História
Bonita carranca na casa pertencente aos descendentes de Ângelo Tenreiro, professor em Mairos, nos finais do século XIX, natural de Argemil e filho do vigário da paróquia de Travancas.
Domus da família Tenreiro há várias gerações
A porta carral, encimada pela cruz, não engana. Estamos diante de uma casa de lavrador abastado, propriedade de um eclesiástico. Embora na padieira de granito não conste o ano, trata-se de uma casa construída há mais de dois séculos, entre o final do século XVIII e o princípio do século XIX.
Segundo o erudito Abade de Baçal, deve ter sido
mandada construir pelo vigário da Paróquia de Travancas, Padre Domingos Manuel Alves da Rocha Raposo Tenreiro, pai de Ângelo Tenreiro, professor em Mairos.
Ângelo Augusto Tenreiro, pai dos atuais herdeiros, jaz no cemitério de Travancas
N 23-09-1922
F 23-07-1994
Dona Francina, além de viúva e mãe, faz parte da direção do Lar do Senhor dos Aflitos, instituição de apoio a idosos.
A casa dos Tenreiros fica lá no fundo do povo, no Bairro do Canto, onde, próximo à Ribeira do Real, se encontram lameiros de erva tenra e alguns dos mais férteis linhares de Argemil da Raia.
Ir até ao fundo do povo é mergulhar na história de uma isolada aldeia de montanha e imaginá-la, até há 50 anos atrás, sem ruas empedradas, privada de automóveis, eletricidadde, telefone, iluminação pública, recuperadores nas lareiras, casas de banho, água quente canalizada, fogão a gás, máquinas de lavar roupa, frigoríficos e televisores! No último meio século houve mais transformações, em profundidade e variedade, que em todas as outras épocas!
É recuar no tempo e imaginar Argemil na Idade Média, com casebres de telhados colmados e habitada por cabaneiros que se vestiam com roupa de burel e alimentavam à base de pão centeio e castanhas.
Até há poucos séculos os serranos desconheciam o milho, o arroz, a laranja e a banana. A batata, trazida do Peru para a Europa pelos castelhanos, só começou a ser cultivada em Trás-os-Montes no início do século XIX.
Até há poucos séculos os serranos desconheciam o milho, o arroz, a laranja e a banana. A batata, trazida do Peru para a Europa pelos castelhanos, só começou a ser cultivada em Trás-os-Montes no início do século XIX.
Apesar do coração ficar dorido com a visão de tantas casas em ruínas e desabitadas, ninguém imagina o bem-estar físico e espiritual que sinto sempre que me embrenho pelo núcleo histórico de Argemil.
O património arquitectónico, quase intacto, acalenta a esperança de que o casario venha a ser restaurado no futuro, por mecenas, por novos habitantes ou por descendentes de emigrantes, regressados às raízes.
O Herdeiro
Chama-se Aníbal, como o célebre estratega cartaginês que combateu os Romanos nas Guerras Púnicas. No entanto, a guerra de Aníbal Tenreiro é outra; passa por restaurar e preservar o património de uma família de gerações de lavradores cuja linhagem conhecida remonta à época dos déspotas iluminados.
A diáspora também não poupou os Tenreiros. Um deles, de um ramo emigrado para o Brasil, em 2010 deixou um comentário no blogue: "Meu nome é Angelo Maldonado Tenreiro, nasci em Travancas, com 14 anos fui para Angola e há 35 anos estou no Brasil". Será parente dos Tenreiros de Argemil? Clicar aqui para ver o comentário completo.
A diáspora também não poupou os Tenreiros. Um deles, de um ramo emigrado para o Brasil, em 2010 deixou um comentário no blogue: "Meu nome é Angelo Maldonado Tenreiro, nasci em Travancas, com 14 anos fui para Angola e há 35 anos estou no Brasil". Será parente dos Tenreiros de Argemil? Clicar aqui para ver o comentário completo.
O senhor Aníbal é um homem de compleição robusta, habituado ao trabalho do campo. Apesar da sua natureza reservada, dá a conhecer o pátio interior, já alterado, da centenária casa rural...
...onde também vive a mãe.
Casa dos Tenreiros, casa com história...
...onde, como noutras casas da raia, foragidos da guerra civil espanhola terão ficado escondidos. Em 6 de janeiro de 1945, a casa, então pertença de Américo Tenreiro, e a de Manuel Aguieiras, foram revistadas por um pelotão de mais de vinte elementos do exército e da guarda-fiscal, fortemente armados, à procura de democratas espanhóis que fugiam aos fuzilamentos fascistas, às ordens do general Francisco Franco.
...onde, como noutras casas da raia, foragidos da guerra civil espanhola terão ficado escondidos. Em 6 de janeiro de 1945, a casa, então pertença de Américo Tenreiro, e a de Manuel Aguieiras, foram revistadas por um pelotão de mais de vinte elementos do exército e da guarda-fiscal, fortemente armados, à procura de democratas espanhóis que fugiam aos fuzilamentos fascistas, às ordens do general Francisco Franco.
Casa dos Tenreiros... uma casa bem transmontana.
Bela carranca de granito para, presumidamente, na sua origem, ter a função de bica.
O espaço onde a carranca se encontra, inapropriado para a função de bica, sugere que terá vindo de outro lugar qualquer e que terá sido encaixada na parede com finalidade decorativa.
Substituídos por tratores, desapareceram os carros puxados por juntas de bois. Quem não recorda com saudade a melodiosa chiadeira que faziam pelas ruas de Argemil? Um dos últimos desses carros de bois é guardado pelos Tenreiros com o zelo que os crentes devotam a uma relíquia.
Casas do Bairro do Canto e domínios dos Tenreiros. Quem resiste a tamanha beleza?
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